Lobo Esfomeado

Pois é...dia 31 de Janeiro. Ficar mais velho torna-se um hábito.
Não sou muito de festas em nome próprio...prefiro ir às dos outros!
Mas este post vem a propósito, já que a musica que pus a tocar quando acordei cheio de força, foi Birthday ( palavra que nada terá a ver com o que festejo hoje!?) dos Beatles.
Incluída no 2º LP que constitui o White Album(Side 3) , a abertura da 2ª parte do (considerado por mim) album menos conceptual da história da musica.
Nunca existiram tantos estilos e processos de composição tão diferentes entre si, divididos também entre quatro pessoas igualmente distintas. Contém um repertório vastissimo(são muitas canções), que distam do mais genial ao "pobrezinho". Gosto da irregularidade.
Birthday tem o poder que preciso diariamente.

Yes we're going to a party party!!!!

Durante mesmo muito tempo, considerei-me um inútil. Carreguei culpa, acolhi toda a espécie de fraquezas, tornando-me triste. É a palavra que melhor me definia até à pouco tempo.
Reconhecia espíritos atónitos perante o meu estado de depressão crónica. Qual seria o espanto? Será que não existia razão para tal? De facto, não.
Esclareço que é o preço de uma sinceridade. Ao ser demasiado transparente, transformei-me em alguém frágil , a vulnerabilidade deu origem a uma manipulação cruel por parte dos outros.
Devemos esconder os nossos pontos mais sensíveis. Tudo o que me faltava era amor próprio.
De que se alimenta o ego afinal? Sei-o, devora, marcha sobre a possível inferioridade dos restantes.
Lembro que somos únicos, a vida em sociedade é um combate pela imposição de personalidade. Quanto maior a estima, maior o conforto e segurança. Há jogadas de bastidores, esmagam-se rivais dispensáveis (que não possuem acção afirmativa) sem piedade, por uma nesga de território.
Chega de lamento, eu não sou um desgraçado. É preciso dividir a culpa para que não tenha uma concentração tóxica. Há um sorriso novo nesta cidade.

E eis que tudo se metamorfoseia em sentimentos mais coloridos.
Há que arrumar o passado em gavetas fechadas, desviar a atenção do pensamento para a suavidade de um viver mais imediato. Vou esquecer termos como eficácia e perfeição, como erro e punição.
Quero abrir os meus olhos devagar e nesse longo instante, inspirar aromas e odores, vociferar murmúrios, enterrar amores. Amar o mundo é urgente, inclui amar-te a ti ( e a ti...).
A palavra de hoje é conhecer, explorar o mundo sem ter medo de me perder.
A precisão é uma régua que desce para te castigar a mão. Aprende.
O melhor do mundo é uma mulher.

Na cover de Some Velvet Morning (original de Lee Hazelwood) pelos Primal Scream, Kate Moss sussurava: "Look at us but do not touch..."
Acho que define o softcore requintado.Não deixa de ser agressivo, mas é clean, portanto mais agradável , artístico, poético.
Por falar nisso, em Berlim está patente uma exposição retrospectiva de Helmut Newton, fotógrafo célebre pelos seu nus, retratos.Morreu o passado dia 23 de Janeiro, acidente de automóvel.
O mais recente video dos Air, Cherry Blossom Girl, é exemplo do assunto que discuto acima. Gosto. Há beleza, sexo , decadência, hipocrisia, mágoa...erotismo,um video interessante, o sonoro é também hipnótico.

Helmut Newton

Air

Lá está a passar na TV o video Milkshake de Kelis...
God!
Há muito que conheço a Kelis, mas tem o dom de me surpreender cada vez que dispara um album novo.
See for yourselves...

Nada melhor do que musica para definir um estado de espírito.
Em que se traduzirá a audição de Pedro e o Lobo de Sergei Prokofiev? Nem mais, é mesmo uma indução de reminiscências.
Saudades de ser um puto curioso, de olhos bem abertos, boquiaberto de tanto espanto. Seria demasiada emoção para a idade...
O que é certo é que me continua a fascinar.
Procurar no limite da nossa memória, aquilo mais antigo que nos conseguimos lembrar é um desafio para a vida.

Tudo leva tempo a digerir, e há coisas que não me imaginava ouvir, dada alguma resistência minha, preconceitos sem opinião formada convenientemente. É o caso da trilogia de Berlim de Bowie( se considerarmos apenas os albums de estudio Low, Heroes e Lodger).
Isto porque é um Bowie completamente diferente, daquilo que gosto a sério nele (glam, melódico,rock n'roll, atitude de desafio).

Nesta fase, Bowie enfrenta ao mesmo tempo, divórcio, cocaína, acusações de ser simpatizante Nazi, entre a produção de Idiot de Iggy Pop. Refugiou-se em Berlim, acompanhado pelo profissionalismo de um certo, Brian Eno.

Em Low existem 6 temas instrumentais...depreende-se a sua incapacidade de escrita naquele tempo conturbado. Para além de se mostrar sintonizado com o emergente movimento punk, o que chateou a sério Tony DeFries (então empresário de Bowie,o ladrão dos 16%), que lhe queria boicotar o lançamento do album.
Eno tem influência em Low, muita; mas Bowie parece ser esquecido, quando o trabalho foi desenvolvido em parceria, Bowie/Eno/Tony Visconti.

Iggy Pop pintado por David Bowie

Chove a cântaros!!! Adoro este tempo, o aconchego em casa, o pânico semeado um pouco por tudo quanto é lado. O trânsito, a escuridão, o vidro indistinto , o trovão, tudo é vida no reboliço provocado pelas águas de Janeiro.
Temos que saber apreciar todas as alturas do ano, esquecer a mágoa, pedir perdão.
Somos um magote, uma multidão que tropeça, que se molha, sincronizada que sacode maldições e é abençoada com a tromba de água.
Eu sei nadar...


Estou a ouvir: David Bowie - Low

Conselhos sábios imediatamente renegam o tabaco, o álcool, a cafeína e os químicos (farmacêuticos ou não). A melhor maneira de contrariar o péssimo humor e desvario, é respirar o ar frio do Inverno, visitar os destroços que vêm dar à praia, ler em jardins amplos na companhia de aves canoras.
Os amigos não são aconselháveis, despoletam agressividade incontida. Eles que regressem quando amainar a tempestade.
Ouvir música faz muito bem. Qualquer proposta sonora é indicada desde que agradável ao louco temporário.
Evitar: cores vivas. A luz do dia é mais apreciada quanto maior a densidade de nuvens.
A chuva é um bálsamo para o estado febril( era aqui que eu aconselhava a lama para a pele, mas seria excessivo).

Ando a ouvir: Tom Jobim - Inédito

Como combater a falta de força de vontade?
Simples, só preciso de arranjar força para a combater...
Não...não quero começar a dissecar as razões das minhas diferenças.
Sou assim, porque sou, ponto.
Se o meu comportamento faz transparecer alguém alienado, que faça.
A grande solução ( encontrei-a) é desaparecer.
Desaparecer mesmo, não como era meu apanágio (ser incógnito), evaporar a sério.
Porque, quem raio quer saber de mim?
Ninguém.

A actualidade já não me diz nada.
Sempre tive alguma precaução para não ficar exilado no passado, para poder viver o presente.
Não foi nenhuma estratégia, mas deduzi ter mais tempo para vasculhar os poeirentos fragmentos, quando fôr incomensurável o número de recordações.

Memória : só me tens traído. Fazes irrelevante uma sobrevivência.
Só existe uma resposta para este tipo de conclusão, e é o desinteresse pelo quotidiano, pelo meu dia-a-dia. Não será assim tão monótono, mas é arrepiante pela minha postura metalizada: Fria e extremamente cortante.

Os olhos dos outros reflectem um ser apático, cruel pelo silêncio e gelado pela distância.
Como me tornei...
Só não me declaro doente, porque a consciência de tudo aflige-me, importuna-me, tortura-me, não me dá sossego. Graças a um comodismo ( assombrado pela maldita consciência), a uma preguiça sem fim, o mundo deixou de girar.
Parado, posso ser um sinal de trânsito, uma estátua, uma árvore, e tantas outras coisas que chamam atenção quando calha, mas nunca serei uma pessoa.

Nunca levei isto dos Blogs a sério, mas é verdade que me descuidei com a manutenção do único que possuo. Desde Novembro que não acrescentava nada de novo,prometo ser mais assíduo.
Vou tentar que isto tenha algum interesse.
Abraços